| Educação  infantil no Brasil:
                a perspectiva do acesso
            e do financiamento Fernanda  da Rosa Becker ** Mestranda em Administração Pública na Fundação Getulio Vargas (EBAPE/FGV),  Síntese: O presente trabalho busca traçar 
              um diagnóstico da atual situação de acesso 
              e financiamento da educação infantil no Brasil. A 
              análise identifica esses dois fatores como os principais 
              obstáculos a serem superados para que tanto as metas de expansão 
              da rede de ensino como a melhora do atendimento sejam alcançadas.A educação infantil constitui o nível inicial 
              da educação, reconhecida como direito da criança 
              em inúmeros documentos (crc/2005 e especificamente no 
              Brasil: cf1988, ldb/96 e eca/90) e, na atualidade, está presente 
              na legislação interna da maioria dos países. 
              Tradicionalmente atende a crianças de 0 a 5 anos e se divide 
              em dois níveis: a creche e a pré-escola. Nas últimas 
              décadas ocorreram importantes mudanças na legislação 
              brasileira que resultaram numa alteração do sistema 
              de financiamento e na questão do acesso a esse nível 
              da educação.
 Palavras-chave: educação infantil; financiamento; 
              acesso à educação.
 SÍNTESIS: El presente trabajo busca trazar un diagnóstico 
              de la actual situación de la educación infantil en 
              Brasil, en cuanto a su acceso y a su financiación. El análisis 
              identifica esos dos factores como los principales obstáculos 
              que deben ser superados para que tanto las metas de expansión 
              de la red de enseñanza como la mejoría del servicio 
              sean alcanzadas.
 La educación infantil  constituye el nivel inicial de 
              la educación, recon-ocido como derecho del niño 
              en innumerables documentos (erc/2005 y específicamente en 
              Brasil: cf1988, ldb/96 y eca/90), en la actualidad, está 
              presente en la legislación interna de la mayoría de 
              los países. Tradicionalmente atiende a niños de 0 
              a 5 años y se divide en dos niveles: la guardería 
              y la etapa preescolar. En las últimas décadas se han 
              producido importantes cambios en la legislación brasileña 
              que han conllevado a una alteración del sistema de financiación 
              y a la forma de acceso a ese nivel de educación.
 Palabras clave: educación infantil; financiación; 
              acceso a la educación.
 ABSTRACT:  The present paper aims at making a diagnosis 
              of the current situation of childhood education in Brazil, regarding 
              access and financing. The analysis identifies those two factors 
              as the main obstacles that have to be overcome, in order to achieve 
              the goals in expansion of the teaching network, and in service improvement.
 Childhood education is the first level of education, acknowledged 
              as a children’s right in countless documents (erc/2005 and 
              in Brazil specifically: cf1988, ldb/96 y eca/90). Nowadays, it is 
              included in the domestic law of most nations. Historically, it serves 
              children from age 0 to 5, and it is divided in 2 levels: nursery 
              and preschool. During the past decades, the Brazilian legislation 
              has undergone important changes that have entailed an alteration 
              in the financing system and in the way this level of education is 
              accessed.
 Key words: childhood education, financing, access to education.
  1.      Introdução Educação  infantil: etapa inicial da educação, reconhecida como direito da criança em  inúmeros documentos (crc/2005 e no  Brasil: cf1988, ldb/96 e eca/90)  e, na atualidade, presente na legislação interna da maioria dos países. Atende  a crianças de 0 a  5 anos e se divide em duas etapas: a creche (0 a 3 anos) e a pré-escola (4 a 5 anos).   Atualmente,  verifica-se a existência de diferentes tendências relativas ao nível inicial da  educação infantil. Uma, defende a acolhida de crianças nas instituições desde  muito cedo, ainda antes de ela completar um ano de idade, como conseqüência das  exigências de realização pessoal das mães e dos ganhos da educação coletiva.  Essa atitude se intensifica cada vez mais nos últimos tempos a partir das  conquistas obtidas pelos movimentos feministas. Outra tendência é a de  prolongar a licença maternidade, mantendo em casa a mulher com vistas a  proporcionar à criança um desenvolvimento, que, na perspectiva psicanalítica  tradicional, aumentaria as possibilidades de formar um adulto equilibrado e  feliz. Processo muitas vezes estimulado pelo próprio governo, como é o caso,  por exemplo, do kinderbetreuungsgeld1 na  Áustria. É preciso salientar que essa última tendência acentua-se em países  tecnologicamente mais desenvolvidos.   No  caso brasileiro, prevalece a primeira tendência em relação às creches, em  virtude de haver um número cada vez maior de mulheres, de todos os estratos  sociais, procurando instituições (oficiais ou não) que recebam seus filhos, por  razões diversas, destacando-se, principalmente, suas ocupações profissionais.  Ao mesmo tempo, é importante ver a relação criança-ambiente como responsável  pela integração da criança, além de se perceber a instituição de acolhimento  infantil como um elemento integrador que deve trabalhar todas as relações,  podendo desempenhar um papel positivo no desenvolvimento infantil.   Ao  considerarem a pré-escola, pesquisas apresentam inúmeros benefícios para as  crianças que atendem a esta etapa da educação, como a redução da mortalidade  nesta faixa etária, maior desenvolvimento cognitivo, maior tempo de permanência  na escola, redução de repetências e de abandono da escola e até mesmo maior  aquisição de vocabulário, devido à convivência desde cedo em diferentes  ambientes (Haddad, 2006; Relatório efa-2006;  Griffin, 2006). A criança que freqüenta a educação infantil tem, em média, um  ano a mais de escolaridade do que aquela que ingressou na escola diretamente no  ensino fundamental. E tem 32% a mais de chances de concluir o ensino médio (mec, 2006).  No  entanto, há outras concepções em voga na atualidade. Particularmente  interessante é a visão decorrente do desenvolvimento de uma nova «sociologia da  infância». Esta visão está presente na convenção de direitos da criança (2005)  que concebe-a como um sujeito de direito, com voz própria e entende a educação  infantil como uma etapa de desenvolvimento, uma etapa importante para o momento  presente da criança e não um «investimento» em longo prazo como na tradicional  visão centrada na formação de capital humano (Haddad, L. 2002; Trisciuzzi, L. e  Cambi, F. 1993).  Devido  ao amplo reconhecimento da contribuição da pré-escola para as crianças  (independentemente da visão adotada), e para o sistema educacional como um  todo, alguns países, como por exemplo, o México, já incluíram este segmento  como etapa obrigatória da educação. No Brasil, ainda não se dá esta  obrigatoriedade. A história de atendimento à criança em idade anterior à  escolaridade obrigatória foi marcada, em grande parte, por ações que  priorizaram a guarda das crianças. Em geral, a educação infantil, e em  particular as creches, destinava-se ao atendimento de crianças pobres, isto é,  os serviços prestados – seja pelo poder público seja por entidades religiosas  e filantrópicas – não eram considerados um direito das crianças e de suas  famílias, mas sim uma doação, que se fazia sem grandes investimentos. Além  dessas iniciativas, também as populações das periferias e das favelas  procuraram criar espços coletivos para acolher suas crianças, organizando  creches e pré-escolas comunitárias. Para tal, construíram e adaptaram prédios  com seus próprios e parcos recursos, o que seguem fazendo na ausência do Estado  (mec; 2006).  A  Constituição de 1988 representou um grande avanço, ao estabelecer como dever  do Estado, por meio dos municípios, a garantia à educação infantil, com acesso  para todas as crianças de 0 a  6 anos a creches e pré-escolas. Essa conquista da sociedade significou uma  mudança de concepção. A educação infantil deixava de se constituir em caridade  para se transformar, ainda que apenas legalmente, em obrigação do Estado e  direito da criança.  Tanto  as pesquisas e os estudos quanto as pressões da sociedade civil organizada  reafirmaram esses valores na ldb,  promulgada em 1996, que considera a educação infantil a primeira etapa da  Educação Básica. Na ldb, a  construção de novas unidades e a conservação das instalações escolares foi  incluída nos orçamentos de educação com o objetivo de aumentar quantitativa e  qualitativamente a oferta deste serviço. A partir daí, uma série de documentos  legais é produzida com o objetivo de definir critérios de qualidade das  unidades destinadas à educação da criança de 0 a 5 anos. Entretanto,  particularmente quanto a estes aspectos, atendimento e instalações, ainda há  sérios problemas a serem enfrentados, conforme o diagnóstico apresentdo no Plano  Nacional de Educação.  É  importante ressaltar, entretanto, uma mudança recente feita na legislação: até  o ano de 2005, o atendimento obrigatório focava crianças de 7 a 14 anos, mas, a partir da  Lei 11.274/2006, foi feita a inclusão de mais um ano e estendido o atendimento  a crianças de 6 anos. Esta foi uma medida importante, na perspectiva da  garantia do direito à educação e da existência de oferta correspondente à  demanda, ao considerar a diferença entre a matrículas de crianças até 1 ano e o  de crianças com 6 anos. O segundo dado chega a ser 90 vezes superior ao  primeiro (Kappel,Carvalho e Kramer;2001).   O  presente trabalho busca traçar um diagnóstico da atual situação da educação  infantil no Brasil com o objetivo de analisar a questão do acesso e do financiamento,  dois dos principais obstáculos a serem superados para que tanto as metas  quantitativas como as qualitativas sejam alcançadas. O estudo está dividido em  quatro partes, das quais a primeira é esta introdução; a segunda apresenta o background da Política Educacional no Brasil com foco na questão do financiamento e do  acesso; a terceira analisa com base em dados empíricos a estrutura das creches  e pré-escolas e a última traz alguns comentários à guisa de conclusão.  2.      Política Educacional, Financiamento e  Acesso Nas  duas últimas décadas, a Política educacional no Brasil passou por mudanças  significativas. Atualmente a educação básica está descentralizada do ponto de  vista administrativo e tem seu foco posto no ensino fundamental, etapa da  educação que compreende nove anos de ensino obrigatório (cf1988, ldb/96  e Lei 11.274/2006). Ao considerar a ênfase no ensino fundamental deve-se  ressaltar que se trata de uma recomendação presente em documentos do Banco  Mundial (Altmman, 2002) e facilmente identificável por meio de uma análise do  atual modelo de financiamento da educação básica.   A  Constituição de 1988 definia o percentual mínimo das receitas a ser utilizado  para o financiamento da Educação pública. O montante definido foi: 18% do  orçamento da União (e não mais os 13% da Emenda Calmon) e 25% da receita dos  impostos dos Estados e Municípios. Em 1996, a ldb  (Lei de Diretrizes e Bases) introduziu uma mudança nestes percentuais: a  partir desta Lei, os municípios poderiam determinar um percentual diferente  para este fim (respeitando sempre o mínimo de 25%) através da Lei Orgânica de  cada cidade. No tocante à descentralização, a Constituição Federal de 1988  definia da seguinte forma as competências administrativas na área da educação  (tabela 1).  Destarte,  os municípios são responsáveis pela provisão da educação infantil e pelo ensino  fundamental. Ao considerar a questão do financiamento da educação fica  determinado um percentual mínimo a ser gasto com a educação básica, mas não há  dentro desta vinculação uma determinação de um mínimo a ser gasto com as  diferentes etapas que a compõem. A determinação da cooperação técnica carece de  maior especificação além das responsabilidades que competem a cada esfera de  governo. Os municípios, esferas mais próximas à população, são cobrados e  constantemente estão obrigados a atender a demandas locais que nem sempre são  de sua competência. 
  Assim,  ao longo da década de 90, a  maioria dos municípios direcionou grande percentual destes recursos para o  ensino fundamental e deixou os investimentos na educação infantil, etapa não  obrigatória, sujeitos à disponibilidade orçamentária. Em localidades onde o  Estado assumiu quase totalmente a provisão do ensino fundamental, como na  região metropolitana do estado de São Paulo, os municípios investiram e  construíram uma ampla estrutura de atenção à educação infantil.   Em  1996, foi criado o fundef2, fundo que distribuía recursos para estados e municípios de acordo  com o número de crianças matriculadas no ensino fundamental. Desenhou-se e se implantou  um modelo de financiamento próprio, com regras claras e rígidas, que  assegurassem não só a prioridade legal, mas também a prevalência e a  permanência de um núcleo privilegiado. A visão sistêmica, portanto, não esteve  presente na formulação do fundef.  Tampouco este contribuiu para a implantação dessa nova concepção de educação,  que passou a ser necessária para todos no mundo moderno.  Logo,  a criação deste fundo agravou a situação de financiamento da educação infantil,  até mesmo nos municípios que só ofereciam esta etapa da educação. O mecanismo  de arrecadação e distribuição do fundo fazia com que cidades que não tivessem  rede de ensino fundamental perdessem recursos e foi o grande responsável pela  municipalização do ensino fundamental no Brasil (Relatório efa-2000).  Além  disso, verificou-se uma tendência nacional para retirar as crianças de 6 anos  das pré-escolas e matriculá-las no nível seguinte com o objetivo de ampliar o  volume de recursos recebidos. Esta tendência associada a uma demanda por atendimento  resultou na Lei 11.274/2006 e na criação do ensino fundamental de nove anos.  O fundef esteve em vigor até o ano de  2006, quando foi criado o fundeb –  Fundo de Manutenção da Educação Básica, que corrigiu as falhas do modelo  anterior no tocante à educação infantil e passou a destinar recursos de acordo  com o total de matrículas em todas as etapas da educação básica.   A  partir deste momento, pode-se considerar que a educação infantil não é mais  concebida como uma etapa da educação de importância menor. Ela ganhou espaço  político, afirmou-se tecnicamente e encontra defensores em todos os âmbitos da  sociedade. Por isso, está presente no fundeb  em igualdade de condições com as etapas seguintes do processo  educacional (Didonet, 2006).   Apesar  da inclusão do primeiro nível da educação não se pode considerar que de fato  esta iniciativa terá como resultado um aumento da oferta da educação infantil  e, conseqüentemente, do acesso em todos os municípios brasileiros. O modelo de  composição do fundo sofreu alterações em relação ao modelo do fundef, isto é, novos tributos foram  vinculados e o percentual de vinculação foi alterado de 15% para 20%. No  entanto, os novos impostos vinculados não são receitas próprias dos municípios.  Assim, novamente os pequenos municípios acabaram por perder recursos na  partilha do fundo uma vez que são os que têm maior participação de  transferências na receita total. Os municípios maiores são mais autônomos,  conseguem a maior parte de sua renda por meio de receitas próprias e também são  os responsáveis pelas maiores redes escolares, portanto, possuem um maior  coeficiente de repasse do fundo que é feito com base no total de matrículas de  cada cidade. Em conseqüência deste mecanismo de captação e de divisão de  recursos, 34% dos municípios perderam receitas com o fundeb em 2007(cnm;  2008).  Destarte,  o ganho de recursos só é efetivo nos estados em que há a complementação da  União, isto é, quando o volume arrecadado é inferior ao valor mínimo nacional.  No primeiro ano de vigência do fundeb,  oito estados receberam a complementação: Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Pará,  Paraíba, Pernambuco e Piauí. No ano de 2008 além destes oito, o estado do  Amazonas passou a receber a complementação.  Deve  ser ressaltado que a avaliação feita pela Confederação Nacional dos Municípios  (cnm) constatou que o valor médio  do aluno na creche em 2007, no fundeb,  foi de R$ 1.057/ano, bem abaixo do custo efetivo, pois segundo pesquisa  realizada o custo seria de aproximadamente R$ 2.866,78/ano.   Ao  considerar a pré-escola, o valor médio do aluno em 2007, foi de r$ 1.189,25/ano, pouco abaixo do custo  levantado pela pesquisa feita pela cnm/ufrgs,  de aproximadamente R$ 1.252,5/ano.   Assim,  a ampliação da oferta de creches permanece fortemente ligada à capacidade  financeira e de recursos humanos de cada cidade, já que o valor que os  municípios precisam complementar para a manutenção é bastante significativo.   A  demanda por creches e pré-escolas é crescente, mas o acesso continua restrito a  uma pequena parte da população com recursos para buscar uma instituição privada  que atenda a suas necessidades e aos poucos que conseguem lugar entre as vagas  oferecidas na rede pública. O acesso à educação infantil, muitas vezes, fica à  mercê de programas e projetos pontuais financiados pelo governo federal e/ou  dos estados, com indefinições quanto à qualidade de sua oferta (Souza; Faria  2005).  
   Apesar do obstáculo do financiamento, é  possível constatar uma evolução do atendimento ao longo dos últimos anos. A  próxima tabela traz dados que ilustram o aumento do acesso em virtude das  mudanças na legislação citadas anteriormente e de um maior reconhecimento da  importância da educação infantil. Os dados estão divididos por regiões e  unidades da federação com o objetivo de mostrar que há diferenças na evolução  nos contextos intra-regional e inter-regional. A abordagem se faz em três  momentos, nos anos de 1991 e 2000 quando a taxa foi calculada com base nos  dados do censo demográfico e nos dados de matrícula disponibilizados pelo mec; e no ano de 2007 com base nos dados  do censo escolar e da contagem populacional de 2007 (ibge). 
                A  tabela 2 mostra que nos últimos dezesseis anos houve um crescimento médio de  aproximadamente 24% no atendimento a crianças de 0 a 5 anos (medido pela taxa  bruta de matrícula). Houve de fato uma expansão da rede, mas este resultado não  pode ser atribuído somente a este fator: há fatores demográficos, como a  redução da taxa de fecundidade e conseqüente redução do total da população de 0 a 5 anos, que têm influência  direta nestas taxas. 
 
 
                Em  relação a 1991, há uma variação no contexto interestadual na distribuição do  atendimento: o estado do Sergipe, até então, cobria o maior percentual (24%) da  população com idade entre 0 e 5 anos, enquanto em 2007 o maior percentual é  referente ao estado do Marnhão (58%). Desta forma, os estados que detêm o  maior atendimento pertencem à região Nordeste, pouco desenvolvida, e  caracterizam a existência de um esforço do setor público (Demo, 1995). Ao  observar a variação entre os anos de 2000 e 2007 constata-se que das 5 maiores  variações no período, 4 são de estados (Maranhão, Pará, Pernambuco e Piauí) que  recebem a complementação da União no fundeb.  Esse resultado evidencia a forte correlação entre financiamento e acesso  existente no país e confirma a hipótese de um maior esforço do setor público  nestas localidades.  
                No  entanto, o mesmo esforço não pode ser atribuído aos resultados de todos os  estados. Houve uma expansão da oferta do setor privado, o que explica, em  parte, a nova distribuição percentual da taxa bruta de matrícula. Por não se  tratar de uma etapa obrigatória e, como já citado neste texto, por falta de  definição de quais são as competências legais das esferas de governo em um  regime de cooperação técnica no que concerne ao ensino fundamental, os  investimentos em educação infantil oscilam de acordo com as prioridades de cada  governo local, mesmo havendo uma valorização deste segmento da educação em  nível nacional. 
                Atualmente,  verifica-se, ao comparar as cinco regiões, que o maior atendimento está na  região Nordeste (aproximadamente 42%), seguida das regiões Norte (39%) e  Sudeste (38,5%). Apenas essas regiões apresentaram no ano de 2007 uma taxa  superior à nacional. 
                No  contexto intra-regional, há diferenças expressivas como fica claro ao comparar  as taxas dos estados de Minas Gerais e São Paulo, que apesar de serem  «vizinhos» possuem uma diferença percentual de 21% no atendimento a esta etapa  da educação. Deve-se observar ainda que estas taxas envolvem o total de  matrículas do setor público e do privado e que por esta razão, em localidades  mais desenvolvidas economicamente, como o estado de São Paulo, onde a população  tem maior renda, haverá maior atendimento em função de maior oferta, não  somente do setor público mas também do setor privado (responsável por 48% das  matrículas em creche e 19% da pré-escola neste estado). 
                Portanto,  há ainda forte elitismo na educação infantil no Brasil (Plank, Sobrinho e  Xavier; 1994). Houve forte expansão do setor público em especial na pré-escola,  mas esta expansão foi acompanhada por uma expansão do setor privado,  principalmente por meio de creches. A estrutura administrativa atual dos  estabelecimentos de ensino será objeto de análise do próximo item.  3.      Estrutura da Educação 
              Infantil no Brasil
                No  item 2 foi abordada a questão da descentralização, do financiamento e do acesso  à educação infantil. Neste tópico será feita a análise da distribuição de  matrículas por etapas da educação infantil, por administração e por região  geográfica. A próxima tabela apresentará a divisão de matrículas no interior do  setor público: 
 
                A  municipalização da educação infantil torna-se evidente tanto em relação às  creches como à pré-escola. O novo fundo de financiamento da educação (fundeb) pode ser um importante incentivo  para este processo, uma vez que considera as competências legais de cada esfera  de governo no momento de contabilizar as matriculas. Assim, matriculas na  educação infantil de estabelecimentos estaduais e federais não são  contabilizadas para fim de repasse de recursos, já que pela legislação vigente  este nível de ensino é competência da esfera municipal.  Deve-se ressaltar a grande participação do setor 
              privado na provisão da educação infantil. Em 
              regiões com menor grau de desenvolvimento sócio-econômico 
              e baixo atendimento escolar, como as regiões Norte e Nordeste, 
              há um maior atendimento por parte do governo (à exceção 
              dos estados de Pernambuco e Amapá). Isto pode ser um indicador 
              de que o maior atendimento das regiões mais desenvolvidas 
              e concentradoras de matrículas (como a região Sudeste) 
              existe em função de uma maior participação 
              do setor privado. A oferta de educação por parte do 
              setor privado em geral é condicionada à renda (Demo, 
              1995; Malta, 2006) e à demanda local. Há diferenças 
              regionais que explicam alterações no tocante à 
              demanda local, como, por exemplo, fatores demográficos: as 
              regiões Norte e Nordeste possuem o maior percentual de população 
              de 0 a 5 anos em relação ao total do país, 
              alta fecundidade e famílias maiores (número de componentes). 
              A relação com a demanda por educação 
              infantil é direta. Cabe destacar a hipótese assumida 
              na parte inicial deste trabalho: a necessidade de um lugar para 
              deixar os filhos e ingressar no mercado de trabalho. Quando a família 
              é maior e o número de irmãos mais velhos para 
              «cuidar» dos menores é maior, verifica-se uma 
              tendência a optar por deixar a criança com um membro 
              da família em vez de buscar um estabelecimento de ensino.
                No  entanto, não é possível assumir que sejam estas as únicas causas das variações  existentes. Como já abordado neste texto, há diferenças no grau de investimento  na educação infantil que têm como causa a existência (ou não) de «vontade  política» por parte dos governantes.  
                Em  2 estados e no Distrito Federal (df),  a participação do setor privado chega a ser superior à do setor publico quanto  à oferta de creches, o que é um indicador do forte elitismo existente nesta  etapa do ensino, são eles: Amapá e Minas Gerais3.  
                Esta  seção teve como propósito traçar um diagnóstico da atual estrutura da educação  infantil. A próxima trará alguns comentários e apresentará as conclusões deste  estudo.  4.      Considerações 
              finais
                Conforme  analisado neste artigo, há um avanço no país em direção ao reconhecimento da  importância da educação infantil. Observa-se ainda a existência de vários  obstáculos a serem superados a fim de se obter uma experiência de sucesso, uma  educação de qualidade com eqüidade para todos os que a desejarem. 
                A  falta de recursos é um dos principais obstáculos: sem orçamento não se executam  projetos. O financiamento é insuficiente em grande parte dos municípios e a  população que não é atendida não conta com recursos próprios para custear a  formação de suas crianças no setor privado.  
                Assim,  surge outro problema: o acesso. As famílias pobres são as que mais necessitam e  as que menos têm acesso: «a lógica dos privilégios é oposta à das necessidades»  (Demo, 1995). Os pais que têm condições econômicas colocam seus filhos em  estabelecimentos privados, que aparecem com forte participação neste segmento  da educação, suprindo uma demanda não atendida em termos quantitativos e  qualitativos. O atendimento a esta faixa etária está crescendo, mas ainda é  muito baixo, em especial no caso das creches.  
                Espera-se  que o novo fundo de financiamento da educação básica seja um incentivo para que  os governos locais, responsáveis pela provisão deste nível de educação, ampliem  a oferta de modo que o direito à educação seja garantido de forma equânime para  toda a população. O fato de quatro das cinco maiores variações na taxa bruta de  matrícula para o período analisado serem associadas a estados que efetivamente  tiveram um aumento da verba vinculada à educação é um sinal de que o  financiamento ainda é o principal obstáculo a ser vencido para que seja  possível ampliar o acesso.  5.      Bibliografia
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 Notas 1 Ajuda financeira concedida pelo governo a mães  ou pais até a criança completar 2 anos, caso permaneçam em casa cuidando da  criança neste período. É necessário comprovar ter renda bruta anual inferior a  14.600 euros. Mais informações em:  <http://www.help.gv.at/Content.Node/8/Seite.080600.html>.                   2 Fundo de Manutenção e desenvolvimento do  Ensino Fundamental e valorização do magistério – composto por receitas  vinculadas de estados e municípios.                   3 De acordo com os dados do Censo Escolar 2007,  disponibilizados pelo inep/mec.       |