|
Atualmente, no contexto latino-americano, quais são as práticas e análises sobre a gestão educacional que podem agregar alguma teoria ou reflexões a partir de experiências em andamento ou já concluídas? A convocatória deste monográfico reflete sobre essa pergunta-chave. Os resultados parecem dar conta desse questionamento inicial, sobretudo, pela visibilidade das contradições intrínsecas a essa prática implementada, nesses países, desde a segunda metade do século passado e aprimorada, mais recentemente. Dentre os paradoxos dessa dimensão das práticas pedagógicas, a gestão educacional parece deixar ainda mais evidente sua relevância quando considerados os temas que perpassam seu aprimoramento, a saber, o papel do poder e do conflito, a busca da equidade e da justiça social, do ideal de emancipação humana e da mudança social.
Coerentemente, as contribuições que constituem essa publicação representam parte das conquistas e dos desafios que tem início com o texto de Sofia Lerche Vieira e Eloisa Maia Vidal: e colaboradora a partir de uma dúvida: seria uma gestão democrática da educação ou gestão democrática da escola? Desde o contexto brasileiro, como tratar de processos educacionais democráticos consolidados em entorno de redemocratização recente dessa sociedade? O texto intitulado “Gestão democrática da escola no Brasil: desafios à implementação de um novo modelo” trata exatamente desse processo.
Nesses momentos de transição histórica para as relações democráticas de uma sociedade, são conhecidas as interações dos processos de universalização – com qualidade – da educação básica e a redemocratização como parte da consolidação dessa reconstrução societária. Para tanto, ainda no contexto brasileiro, foi gerado uma ferramenta, conhecida como Índice de Qualidade da Educação Básica (ideb), inspirado em outras experiências internacionais, com vistas á objetivação dos indicadores de um conceito tão profícuo como educação de qualidade. O processo de gestão da implementação desse indicador resultou no artigo de José Márcio Silva Barbosa e Rita Márcia Andrade Vaz de Mello que tratam dessa questão e demonstram que o caráter fundamental do trabalho do gestor nesse processo que permite construir um diagnóstico das especificidades da realidade escolar, como apontar rumo, corrigir distorções, redimensionar metas e superarem obstáculos, colocando em evidência o seu papel de liderança na articulação da melhoria dos resultados do mesmo e da qualidade educacional.
A liderança como aspecto que perpassa os textos anteriores é evidenciada nas análises de Aurora Bernal Martínez de Soria e Sara Ibarrola García e colaboradora que abordam a descentralização de tal processo ao sistematizar o artigo « ‘Liderazgo del professor: objetivo básico en la gestión educativa » . Trata-se de um modo concreto de vislumbrar as mudanças na cultura organizacional das instituições escolares, ainda marcadas por práticas, muitas vezes, hierarquizadas ou, ainda, patrimonialistas. No artigo seguinte, Maria Lopes segue com a questão da liderança associando às boas práticas escolares e atribui um sentido diferenciado ao que chama de práticas de liderança. Portanto, desde distintos países uma abordagem profícua sobre o traço de liderança fundamental à gestão educacional nos distintos modelos de gestão educacional.
Nesse modo de estruturação das análises, a existência desses modelos de atuação se apresentam como uma busca recorrente das experiências relatadas e, até mesmo, das pesquisas realizadas. Assim, parece oportuna a estrutura e o funcionamento do processo de gestão apresentado com o caso de Terragona e analisado por Charo Barrios-Arós e colaboradores no texto «Modelos y funciones de dirección escolar em España » .
Em nível macrossociológico e considerando uma demanda que perpassa todos os países latino-americanos, sobretudo, o princípio da universalização da educação como uma das Metas do Milênio tem especial sentido quando se trata de pessoas com necessidades especiais. A gestão educacional dessa modalidade de educação está retratada no texto de Miguel Angel Castillo Fuentes intitulado ‘El modelo de gestión en la educación especial (la calidad de atención de las necesidades educacionales especiales’ que aborda desde uma experiencia no México.
Ainda tratando de especificidades com as quais a gestão educacional interage, cotidianamente, são conhecidos os altos percentuais de mulheres que levam a cabo essa função, sobretudo no nível da educação básica. Portanto, há uma dimensão de gênero que não pode ser tratada com indiferença. Elena Surovikina se propôs a essa análise ao realizar «Aproximaciones sistemáticas a la gestión educativa: un estudio del arte desde la perspectiva de género».
Além da questão de gênero, as práticas de gestão deste início de século XXI, contam com outro desafio que seria a internalização dos processos e produtos de uma sociedade informática (Schaff, 1995), em rede (Castells, 1999) ou do conhecimento (Lojkine, 2002). Angel San Martín Alonso e colaboradores analisam «Los tablets y la gestión de los contenidos digitales en los centros escolares». Situado em València (Espanha), suas análises transcendem o caráter local para assumir uma nuance de mundialização de algumas práticas que, necessariamente, devem ser tomadas nos contextos em que se pretende atuar. As novas tecnologias da informação e da comunicação parecem agregar – simultaneamente – a máxima de «pensar globalmente e agir localmente», dadas as especificidades das instituições escolares.
Nessas relações com as demandas de uma sociedade contemporânea, parece representativa uma abordagem sobre as relações com outra instituição social – a família – ainda que reconfigurada em sua estrutura, não pode ser desconsiderada e Ruth Milena Páez Martínez do tema como «Família y escola: alianza necessária en la gestión escolar».
Por fim, mas não menos importante, a questão da avaliação do clima organizacional dos centros escolares de nível superior foi abordada. A proposta de Ciria Margarita Salazar e colaboradores ocorre nesse sentido ao desenhar e validar um instrumento para mensurar e julgar os modos de sentir, pensar e agir (como conceito de cultura) com as especificidades dessa instituição que é, também, uma organização.
Este monográfico cumpre, desse modo, o propósito de sistematizar algumas semelhanças e diferenças entre as perspectivas da gestão educacional e, ao mesmo tempo, evidencia caminhos alternativos utilizados. Fundamentadas num modo pluralista teórico que valoriza a convivência de modelos explicativos e práticas inovadoras adotadas com base em múltiplos significados e interpretações, espera-se que sejam objeto para outras análises e proposições dada a complexidade que tipificam as distintas dimensões das práticas educativas.
Profa. Dra. Márcia Lopes Reis